Por que temos filhos?

Por que ter filhos... em um mundo como esse? em uma vida como a minha? nessa economia? em uma pandemia? É muito fácil encontrar motivos para não ter filhos. A rotina, o dinheiro, a violência, o clima, a crise, a carestia. Acho que é importante pensar sobre isso. Pensar de verdade sobre essas questões, não como quem procura a melhor desculpa do catálogo, mas pensando de fato como isso impacta a nossa vida individual e comunitária.




Há uma multidão de mães desapontadas, frustradas e decepcionadas com a maternidade. Elas falam sobre o peso, a carga, a demanda e afirmam terem sido enganadas por uma visão romântica da maternidade. Certamente elas não refletiram sobre o que estavam fazendo. Dizem que só conheceram o lado exaustivo da maternidade quando chegaram do outro lado e se empenham em pregar essa palavra: cuidado, a maternidade é um fardo! É uma palavra impactante para quem ainda não tem filhos.

A gente não convive mais com crianças. Estamos hermeticamente fechados em nossos pequenos núcleos familiares, vivendo, trabalhando, comendo, passeando e passando todo o nosso tempo com adultos. O que é uma criança? Como vivem? Como se comportam? Isso é normal? Será defeito de fábrica? A incerteza da expectativa acompanhada de tantas avaliações negativas coloca o produto de volta na prateleira.

Afinal, por que alguém teria filhos de propósito em um mundo como esses, sabendo que isso vai estragar a sua vida?

Outro dia uma dessas mães arrependidas disse que, provavelmente, aquelas que amam a maternidade tiveram uma criação muito diferente da que ela recebeu. Sem querer, ela falou uma verdade que ainda não alcançou: a alegria da maternidade não está no sorriso da criança, nos hormônios do amor, na gratificação do ser humano que você está deixando para o mundo. Não dá pra contar com isso, e mesmo que você tenha tudo isso, não vai durar. Não é eterno.

Deve ser muito mais fácil amar a maternidade quando era  o que você queria na vida (a gente está acostumada a falar assim, como se fosse pouca coisa, né?). Por isso se diz que quem foi criada para ter uma profissão exigente, para conquistar o mercado, a fama, o dinheiro, o sucesso, pra ser uma grande bem-sucedida em alguma coisa terá muitas dificuldades com a maternidade.

A maternidade atrapalha. Abre um buraco no currículo. Rouba suas horas de sono, ocupa muito espaço nos seus pensamentos, e na maioria dos dias não é nada gratificante. Todo o seu trabalho em preparar uma refeição fresca, orgânica, colorida e caseira pode ser recebido por uma criança que vai comer só os grãos do feijão, sem caldo. Mas isso tudo depende de como você enxerga o mundo.

A diferença entre o que atrapalha e o que transforma a sua vida está no seu propósito. Afinal, para que você existe? Se o seu propósito de vida é enriquecer, fazer sucesso, engrandecer o seu nome, as crianças vão atrapalhar ou se tornar parte do cenário, terceirizadas ao máximo, aparecendo apenas quando for coerente com os seus objetivos.

Esse não é um texto para te convencer. Se você pensa como eu, isso não será necessário. Se não temos os mesmos valores, não será suficiente. Ninguém precisa justificar as suas escolhas pessoais e familiares para estranhos, mas entender os motivos pode ajudar a olhar para o outro com mais empatia e respeito. Então, por que eu tenho filhos?

Tenho filhos porque não vivo para mim

Para algumas mulheres, a maternidade é um assalto. Aquele serzinho fofo tira as suas horas de sono, a sua autonomia pra sair quando quiser... até as músicas que você ouve no carro agora são escolhidas por outra pessoa de gostos peculiares e repetitivos. A ideia de que eu não posso nem tomar banho em paz é aprisionadora, não tenho como discordar disso. 

Um dia você é livre para pensar somente em si, e no outro tem uma pessoa indefesa que depende de você para sobreviver. É uma grande mudança, e pode ser traumatizante. É muito frustrante não conseguir realizar todos os seus desejos, mesmo os mais simples. Mas sabe de uma coisa? Eu nunca vivi só para mim.

De verdade, ninguém é realmente livre para fazer o que quiser, mas de alguma forma podemos ser escravizados pelos nossos próprios desejos. É fácil viver de picos de dopamina a cada vez que eu faço o que eu quero, minimizando as frustrações com algum amortizante. É difícil fazer o que eu não quero, o que é melhor para o outro, ou para os outros.

Isso é importante para os cristãos. Eu não vivo para mim porque Jesus é Senhor sobre a minha vida. Eu sou livre para desobedecer os meus próprios desejos, fazer a coisa certa e ainda sentir prazer nisso. Eu já não vivia para mim, e as minhas filhas me ajudam a lembrar que eu não sou o centro de nenhum universo, nem do meu.

Tenho filhos porque a minha casa não é aqui

Seres desejantes que somos, nunca estaremos saciados. Você pode se priorizar, fazer do egoísmo um objetivo de vida, mas alguma coisa sempre vai faltar. C. S. Lewis disse uma vez que se eu não acho nada nesse mundo que me satisfaça, eu só posso concluir que a minha casa não é aqui. Essa esperança de que há coisas melhores na eternidade diminui bastante a pressão sobre os meus objetivos aqui.

Não é que eu não queira mais nada dessa vida, longe disso... é que colocar todo o seu amor, o seu empenho, a sua dedicação nessas coisas que duram tão pouco será inevitavelmente frustrante. Tudo o que não é eterno, é eternamente inútil. Vai ser muito legal ter um título acadêmico, uma casa enorme, um salário bacana, um monte de carimbos no passaporte, mas quanto tempo isso vai durar? E isso tudo serve para quê? Se você pensar na eternidade, o quanto essas coisas importam? Nada. Só as pessoas importam. É melhor investir em vidas.

Tenho filhos porque tenho outra cultura

Nesse ponto, você já percebeu que estamos falando de uma visão de mundo peculiar. Por isso eu disse, não quero te convencer, nem preciso me justificar. O cristianismo é outra cultura. Não é a cultura ocidental consumista e imediatista que a gente vê por aí - até em algumas igrejas ditas cristãs. Amar as pessoas, amar a maternidade, amar o serviço é amar o meu Senhor. É outra cultura.

Eu não apenas fui criada (pelos meus pais) para isso, eu acredito que nós fomos criados (por Deus) para fazer isso. Isso não me impede de estudar, viajar, trabalhar, comprar, guardar momentos para ficar sozinha... mas dá outra perspectiva sobre essas coisas. E olha, vendo o quanto as pessoas andam frustradas por aí, eu não posso dizer que estou do lado errado da história.

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