Relato de parto: Ana Luísa 13.10.2021

Devagar e sem pressa, Ana Luísa dava sinais de sua chegada. A experiência do primeiro parto torna as coisas mais leves. Todas as dores são conhecidas além da teoria. As inseguranças também. O primeiro parto torna todos os outros possíveis. Quando parece que não dá, é aí que termina. Mas quanto tempo a gente aguenta até chegar lá?

Maria Elisa também veio devagar, e eu sempre tomo muito cuidado ao contar para quem vai fazer essa jornada pela primeira vez. Não dá pra dizer, simplesmente, que foram trinta e seis horas de trabalho de parto, sem assustar as pessoas. Aliás, esse trabalho de parto também já foi relatado (clica pra ler). Como dizer, então, de um parto que começou no domingo à noite e terminou na madrugada de quarta-feira?


Vou começar pelo fim: foi tudo muito rápido. Do zero ao nasceu em apenas uma hora. Não deu tempo de chamar ninguém. Nem eu acreditava que já estava no fim. Eu sabia o que eram aquelas contrações, mas também sabia que não poderia ser. Já?!

Durante a semana toda eu tive contrações. Leves e fortes. Curtas e longas. Faltava ritmo. O marido lia o meu rosto e perguntava: "Vai nascer?". Eu respondia "talvez", não como quem brinca com essas coisas, mas quem sabe? Pode não ser nada, pode ser o começo de tudo. Eu vigiava sem dar muito alarme. Não queria mobilizar as pessoas antes de saber o que estava acontecendo.

No domingo à noite, coloquei Maria para dormir e avisei a doula que começaria a contar as contrações. Pedi para o marido buscar a sogra, caso as coisas ficassem animadas durante a madrugada. Enquanto ele estava fora, uma sequência de contrações longas e fortes trouxe uma sensação molhada que não fazia parte da minha experiência. Será que a bolsa estourou?

Não teve 'ploc', nem um aguaceiro pelo chão, mas o líquido escorria pelas pernas. Combinamos por telefone o encontro no hospital para avaliação. Madrugada de domingo e parecia que nenhum bebê estava a fim de nascer. A recepção estava vazia e mesmo assim o meu acompanhante foi convidado a se retirar. Um convite protocolar, não insistido, mas repetido cada vez que eu passava de uma sala para a outra. Os exames estavam bem, mas ainda sem dilatação. As contrações, que vinham embaladas, foram diminuindo até parar.

(Eu culpo o ambiente do hospital? Culpo, sim. Os funcionários, não, mas a instituição, que hostiliza as pacientes e seus acompanhantes desde a porta de entrada. O hospital conhece muito bem a legislação, e sabe que não deve impedir o cumprimento da lei... mas instrui todos os seus funcionários a agir como se desconhecesse os direitos dos pacientes, contando com a ignorância de quem precisa de atendimento.)

O início do trabalho de parto não engrenou. Parece que deu uns seis passos pra trás. Ana Luísa encaixou como uma rolha e segurou o líquido que ainda não tinha vazado. Seguimos com monitoramento e avaliações periódicas com a equipe mais paciente e querida do mundo. Em casa, esperando o trabalho começar pra valer, vendo os últimos momentos se transformarem em penúltimos, nada de muito emocionante acontecendo. Até as noites de sono ficaram mais tranquilas.

Só não era tranquilo ter que visitar o hospital. Em uma das ocasiões, meu marido foi convidado a se retirar quatro vezes nos primeiros dez minutos. A resposta era apenas uma recusa educada, mas ainda assim o segurança foi chamado. Precisamos mostrar o plano de parto e a resposta com o timbre do hospital. Ele foi consultar a enfermagem e retornou pedindo desculpas. "Realmente, como vocês têm autorização pelo plano de saúde, você tem o direito de ficar".

Pra mim, essa justificativa foi o pior de tudo. O direito ao acompanhante não é um privilégio. A declaração do hospital de que eles vão cumprir a lei porque nós fizemos um acordo gerou um constrangimento na recepção do hospital. Do lado de fora, outros acompanhantes esperam sem ter sequer um lugar para sentar. Há quinze anos, a mesma desculpa de "falta de infraestrutura", mas em todo esse tempo não faltou tempo ou recursos. Faltou vontade. O hospital "amigo da criança" é desumano com os seus pais.

Isso cansa. Tudo isso cansa. As contrações que começavam e paravam. A expectativa pela próxima violação de direitos. A ansiedade pelo tempo que passa. Monitorando, medindo, avaliando, medicando... Uma exigência do corpo e da mente, para ter paciência e esperar o tempo do parto. Na terça-feira, a minha preocupação era estar forte para chegar lá.

Maria Elisa vigiava as idas ao hospital, e agora já sabia que a irmã estava por nascer. A despedida foi tranquila, ou pelo menos pareceu. Eu fiquei arrasada pensando na nossa primeira noite distantes, prometi ligar de manhã bem cedo. Ela estava ansiosa para ver a irmãzinha. Nós também.

Quem parecia ter toda a paciência do mundo era o Thiago, nosso obstetra. Já estávamos com quase 48h de bolsa rota quando chegamos para a avaliação. Todos os parâmetros de saúde estavam bons, mas estava na hora de ter a conversa. Falamos sobre indução de parto e tiramos todas as dúvidas do caminho. Não teve pressão, nem manipulação. Eu sabia que podia escolher, mas eu já estava decidida pela indução, para parir enquanto ainda tinha forças.

Me preparei psicologicamente para uma noite daquelas. Geralmente o parto acontece na terceira dose da medicação, depois de dez horas de indução. No quarto, com marido e doula, passamos o tempo entre contrações e histórias. Quando eu resolvi descansar, meu médico voltou para avaliar o colo, que começava a dar sinais de abertura, mas ainda nem um centímetro. Ele aplicou a segunda dose e combinamos o próximo encontro para as seis da manhã... ou antes, se precisar.

Deitada por uma hora após a medicação, as contrações vinham com força. Eu queria sair da cama, ficar em qualquer posição, mas não queria perder o remédio. A Alli me ajudava com posições horizontais quando vinham as contrações, cada vez piores. Uma vez, saiu um líquido e pensei "expulsei o remédio". Ela disse que estava tudo bem. Eu só pensava em quanto tempo faltava pra sair daquela cama, e como faziam as mulheres que eram obrigadas a ficar deitadas o tempo todo.

Quase acabando o tempo, senti o expulsivo e pensei "não pode ser, é cedo". Virei de lado e me agarrei nas grades da maca enquanto fazia força. Um esguicho. Expulsei todo o líquido que ainda tinha na bolsa. Acabou a primeira hora. Mas era só a primeira hora. Se continuasse escalando assim, como eu aguentaria até as seis horas? Nem passou pela minha cabeça que eu já estava parindo.

Levantei pedindo ajuda para ir pro chuveiro amenizar as dores, mas não dei um passo. Agachei e empurrei. Ouvi a Alli dizer algo sobre sinal de dilatação e balancei a cabeça negativamente: "Está saindo... a cabeça!" Depois disso eu só lembro de ouvir correria pra lá e pra cá enquanto eu empurrava o bebê agachada no chão do quarto, ao lado da cama, segurando as mãos de Haralan por cima de uma bola de pilates. Veio com uma mão no rosto, e eu senti que descia de um para jeito diferente. Me concentrei para empurrar devagar. Ela foi amparada pelas mãos da Alli, que a entregou para mim. 2h29, 13 de outubro de 2021.

Depois que eu subi, com ajuda, na maca, não tinha mais interação com o mundo. As pessoas se movimentavam ao redor como num filme, a realidade estava todinha no meu colo. Vi a Alli, e depois o Thiago, dando ordens e criando o ambiente mais confortável que a gente queria. O pai cortou o cordão. A placenta saiu inteira. O períneo, para a minha surpresa, íntegro.

Foi um trabalho de paciência e resistência. Chegamos ao final com uma intervenção na medida certa e na hora certa, acompanhada por pessoas que me deixaram segura para esperar e decidir. Minha gratidão a eles: Alli, Thiago e Haralan. Mais um parto inesquecível pra gente.

MEU TIME 💓

Pai: Haralan Elias Melo Mucelini

Obstetra: Thiago Moura Saura

Parteira: Alli Nunes

Fisioterapeuta pélvica: Tatiane Martins

Fisioterapeuta (pilates): Luanny Nicaretta

0 comentários: